por Maria Lua 16.01.23 8:29
AUG
2
9 poemas de "EU E OUTRAS CONSEQUÊNCIAS", de Tanussi Cardoso
DE FUMAÇA, A PALAVRA
Toda palavra é noite.
Perpetua a angústia do não encontro.
Há sempre perda no contato,
Mesmo que se some à pele o espanto.
Toda palavra é prisão e liberdade.
Intervalo entre som e silêncio.
Toda palavra é falta.
Suspiro entre sopro e chama.
Toda palavra é não.
Dentes demasiados de dor.
Toda palavra é vã e vão.
Ainda que belamente perfeita.
Ainda que de adjetivos – cilada, aparência.
Toda palavra é falácia.
Nada e maravilha.
Toda palavra é nunca.
O amor, por exemplo. Ou como Deus se pronuncia.
(Eis que nenhuma palavra é dia.
A não ser alguma que à esperança mentia.)
Toda palavra ornamenta uma lápide
De mistérios e magias.
Daí, a incompletude – sua infinita largueza.
Daí, a poesia implícita em cada uma:
Barro e cimento. Pedra-viva.
Toda palavra diz-se cedo.
O adeus, por exemplo. Ou como o morto se anuncia.
ORIGEM 1
eu não sou
de onde nasci
eu não sou
de onde vim
nenhuma língua me engana
nenhuma terra me enterra
eu sou
onde estou
eu sou
onde sou
ILUMINAÇÃO
para Antonio Carlos Secchin
É o poema quem diz
o que o poeta não fala:
reticências
recantos
confins.
É o poema quem diz,
não o poeta.
O poeta, sutilmente,
afirma
o que o poema desdiz.
GRÃO
O que de mim se esvai
é o que fica
Sou a permanência
dos dias em que morro
Diariamente construo
não a minha vida
Mas o que dela existir
enquanto morto
POEMA PARA QUALQUER ANO-NOVO
para minha sobrinha, Liane
Acolher pássaros.
Suas sombras de liberdade e beleza.
Ouvir seus piares de dor, fome e prazer.
Compreender a expressão das asas.
Pousá-los nos ombros, deixar-se com eles,
nessa viagem de busca e de calma.
Ser pássaro na sabedoria
de maravilhar-se com a vida
– ínfima e pouca –
em seus mínimos detalhes
de mistério e poesia.
Aprender a transformar migalhas
em sementes de ninhos.
E dividi-las.
Entender a nervura das distâncias
: os obstáculos.
Quedar-se quieto à espera do canto.
E do voo.
DIVAGAÇÕES METAFÍSICAS SOBRE A MORTE DE UM POMBO
“No meio do caminho tinha uma pedra.”
Drummond
Um pombo morto na rua
é somente um pombo morto na rua.
Independe do movimento dos astros.
Não incomoda o Sol.
Não impede o bater dos ventos
nem o cair das chuvas.
O mundo não vai girar ao contrário.
O arco-íris não mudará suas cores
porque um pombo está morto no meio da rua.
A vida seguirá tranquila
e todos os amores permanecerão intactos.
Pernas pularão
o incômodo obstáculo.
Porque ao pombo morto
só caberá o lixo do esgoto.
Será, no máximo,
assunto para um poeta torto.
COTIDIANO
para Igor Fagundes
O poema: um grito em branco.
O dia agônico refém da tarde.
Monumentos perdidos
vozes veladas
tom trágico de vida:
ilha de esculturas e espantos.
O poema: formigueiro de batuques.
O dia se despe pelas janelas:
esquizofrênicos palhaços malabaristas
coloridos sóis
pedaços de escuridão e luz.
O poema morde as mãos vazias.
Escrevo doçura
inocência
crianças
ratos e corvos.
Traço o fio que me resta de inconsciência.
Pedra sobre pedra
e espelho nenhum me contempla.
O poema: solidão incomunicável.
O dia tenso e inadiável.
Todos os lugares
o bar o ônibus o cinema a loucura a raiva o céu
convidam ao definitivo suicídio.
O poema: cavalo pronto a ser montado.
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